
*Orlando Cintra é fundador e CEO do BR Angels
A recente valorização de ações de tecnologia, impulsionada pelo hype da inteligência artificial, reacendeu um debate importante: estaríamos repetindo, em parte, o roteiro da bolha das pontocom? Com solavancos no mercado e expectativas elevadas, cresce a dúvida sobre o que é promessa real — e o que pode virar frustração.
O que apimenta a sensação é o timing: 25 anos depois do estouro da bolha da internet, temos novamente uma revolução tecnológica em curso. Mas será que os aprendizados do passado estão sendo ignorados diante desse novo hype?
A bolha das pontocom: euforia e queda
– Em 2000, o índice Nasdaq alcançou 5.048 pontos, com alta de 500% em cinco anos.
– Em dois anos, despencou para 1.114 pontos: uma queda de 78%.
– Empresas como Pets.com e Webvan faliram rapidamente, mesmo após investimentos milionários.
O motivo? Um excesso de apostas em negócios que não geravam receita ou entregavam valor. Algo que também deve nos fazer refletir diante do hype da inteligência artificial atual.
IA: revolução, sim — mas com os pés no chão
Desde 2020, a Nasdaq voltou a subir com força, passando de 7.500 para 20.000 pontos até o fim de 2023, impulsionada por big techs e pelo avanço da IA generativa (como ChatGPT, Gemini e outros). Ainda assim, as ações já recuaram cerca de 15% desde o pico, com dúvidas no ar.
E vale lembrar: nem toda buzzoword vira uma realidade consolidada. O Metaverso que o diga. Há três anos, parecia inevitável — hoje, mal é mencionado.
Por que a IA pode ser diferente?
– Infraestrutura robusta (cloud, chips, smartphones)
– Consumidores digitalmente maduros
– Casos de uso mais palpáveis no ambiente corporativo
– Avanços em interfaces e acessibilidade
Ainda assim, o mercado corre risco quando a empolgação supera a lógica de negócios.
Valor real é o que sustenta qualquer tecnologia
Mesmo com projeções bilionárias para o setor de IA — a McKinsey fala em US$ 1 trilhão até 2032 —, só sobrevivem os modelos que entregam valor real ao usuário.
– A OpenAI cresceu 1.700% em receita entre 2022 e 2023, mas ainda não é lucrativa.
– Muitas startups ganham manchetes, mas ainda não mostraram como vão se sustentar.
– Falta um assistente digital “matador” que simplifique de verdade a vida de milhões.
No fim, o hype da inteligência artificial pode ser apenas espuma se não houver um plano de negócios claro, que resolva dores reais e seja lucrativo a médio prazo.
IA no Brasil: entusiasmo com necessidade de foco
– Governo lançou R$ 23 bilhões em crédito para fomentar IA
– Para cada R$ 1 público, esperam-se R$ 3,34 da iniciativa privada
– O país é o 15º no mundo em publicações científicas sobre IA
– Cerca de 75% das startups de IA da América Latina estão no Brasil
No BR Angels, vemos todos os dias startups que prometem inovações com IA. Mas é preciso que se enxergue como aquele modelo de negócio vai gerar receita. Sem isso, a IA é mais uma perfumaria que um grande diferencial competitivo sustentável.
Conclusão: o que aprendemos?
O passado ensina que grandes transformações tecnológicas atraem tanto visionários quanto aventureiros. O hype da inteligência artificial pode sim abrir portas para empresas gigantescas. O Google surgiu nos anos 1990 e sobreviveu à bolha das pontocom. Mas também pode levar muitos ao fracasso, se o foco estiver apenas na moda — e não no modelo de negócio.
Pergunte-se: você pagaria para usar aquela solução de IA? Se a resposta for sim, pode haver valor. Se for não, talvez o entusiasmo não seja suficiente para sustentá-la no tempo.
Tecnologia, por mais incrível que pareça, só prospera quando cria valor real para pessoas reais. Todo o resto é espuma.
O post Hype da IA: Estamos repetindo os mesmos erros 25 anos depois? apareceu primeiro em Startups.