As ações de tecnologia mostraram sinais de estabilização nesta terça-feira (28), em especial a norte-americana Nvidia, que ensaiou uma recuperação modesta depois de ter registrado, na véspera, uma queda histórica de 17% no valor de mercado. Esse tombo foi desencadeado pela surpresa gerada pelo lançamento de um modelo de inteligência artificial (IA) de baixo custo pela chinesa DeepSeek, que abalou a percepção de que os rivais dos Estados Unidos estavam à frente e praticamente imbatíveis.
Conforme relatado pela Reuters, as ações da Nvidia, principal fornecedora de chips para aplicações de IA, chegaram a despencar na segunda-feira (27), resultando em uma perda de aproximadamente US$ 593 bilhões em valor de mercado — o maior tombo em um só dia para qualquer empresa listada em bolsa.
A movimentação repercutiu de forma significativa em outros papéis de tecnologia, mas, na manhã de terça-feira, as ações da Nvidia subiram cerca de 5% nas negociações de pré-mercado. Outras companhias do segmento, como Oracle e Marvell Technology, registraram ganhos de 3,4% e 3,6%, respectivamente, enquanto na Europa, empresas do setor reduziram parcialmente as perdas recentes.
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O ponto central da derrocada nas cotações foi o lançamento, pela startup chinesa DeepSeek, de um assistente de IA gratuito. A companhia alega operar com um volume de dados menor e custos drasticamente mais baixos do que as soluções hoje dominantes no mercado. Embora alguns especialistas questionem a veracidade dos valores de custo informados pela DeepSeek, a notícia se espalhou globalmente, chamando a atenção de líderes de tecnologia e até de figuras políticas.
Sam Altman, CEO da OpenAI, dona do ChatGPT, classificou o modelo como “impressionante” e ressaltou que a concorrência pode ser positiva para acelerar a inovação. Já o presidente dos EUA, Donald Trump, afirmou que o avanço da IA chinesa deve servir de “alerta” para as empresas norte-americanas, exigindo maior urgência em seu desenvolvimento tecnológico.
A DeepSeek irrompeu no cenário de IA de maneira inesperada, colocando em xeque a crença de que a China ainda levaria vários anos para se aproximar da competitividade das gigantes americanas. Tal movimento provocou ampla onda de vendas de ações de tecnologia, afetando bolsas em Tóquio, Amsterdã e no próprio Vale do Silício.
Marc Halperin, que codirige a equipe de ações europeias na Edmond de Rothschild, em Paris, disse à Reuters que a tensão gerada pelo episódio pode durar alguns dias, até que o mercado determine se se trata apenas de um “soluço” ou de uma mudança estrutural na confiança dos investidores.
Analistas também destacam o risco de correção brusca, uma vez que muitos investidores de varejo alocaram grandes somas em papéis de empresas de tecnologia cujos múltiplos de valor já se encontram muito acima da média. Dados da Vanda Research indicam que os investidores de varejo aproveitaram a queda da Nvidia para adquirir um recorde de US$ 562,2 milhões em ações da empresa na segunda-feira — um sinal de que parte do mercado ainda vê potencial de alta no médio e longo prazo.
Na Europa, empresas ligadas à fabricação de chips, como a holandesa ASML, tiveram perdas significativas (encerrando a segunda-feira em queda de 7,1%), mas mostraram pequena recuperação na manhã de terça (alta de 0,8%).
Já a Infineon, com base na Alemanha, subiu 0,4%, enquanto o grupo de software SAP apresentou alta mais modesta de 0,2%. Nos Estados Unidos, companhias como Broadcom sofreram um baque de 17,4% na véspera; Microsoft, que investe pesado na OpenAI, recuou 2,1%; e a Alphabet, controladora do Google, caiu 4,2%. O índice de semicondutores da Filadélfia caiu 9,2% — seu maior recuo percentual desde março de 2020.
Para muitos analistas, esse tombo reflete o peso desproporcional de poucas gigantes de tecnologia nos principais índices de ações, acumulando valuations que não deixam margem para erros.
Quedas expressivas na bolsa
Segundo dados da London Stock Exchange Group (LSEG), antes da queda, a Nvidia era negociada a cerca de 60 vezes seu lucro, frente a 22 vezes para o índice S&P 500 como um todo. David Bahnsen, diretor de investimentos da The Bahnsen Group, destacou que essa vulnerabilidade se agrava quando grande parte das carteiras de investidores se encontra concentrada em um punhado de ações.
Outro fator que pode ter intensificado o movimento de queda são as operações alavancadas. Rob Almeida, estrategista global e gestor de portfólio na MFS International, argumentou que muitos investidores haviam tomado empréstimos para financiar a compra de papéis de tecnologia.
Em um dia de quedas expressivas, diversos algoritmos de negociação são acionados simultaneamente para limitar prejuízos, amplificando os efeitos negativos no mercado. Esse fenômeno, diz Almeida, foi potencializado pela popularidade crescente dos chamados “trades automatizados”, que operam sem intervenções humanas diretas.
O foco agora se volta para os balanços de gigantes como Apple e Microsoft, que divulgam resultados esta semana. Os executivos provavelmente vão tentar tranquilizar o mercado quanto aos planos de investimentos em IA e a sustentabilidade de suas margens de lucro. As incertezas, porém, persistem. O surgimento da DeepSeek é visto como um marco que reforça a ideia de uma corrida global pela liderança em IA — não mais limitada a um punhado de empresas dos Estados Unidos.
O setor de tecnologia, portanto, passa a lidar não só com avaliações esticadas, mas também com a possibilidade de concorrência asiática muito mais agressiva do que se previa, especialmente em campos avançados como processamento de linguagem natural e modelos generativos.
Enquanto isso, dados os movimentos recentes, os analistas permanecem atentos a eventuais correções adicionais, que podem ocorrer de forma repentina caso as incertezas sobre a real capacidade de DeepSeek ou de outras concorrentes asiáticas se confirmem. As discussões sobre regulação, segurança de dados e eventuais restrições comerciais também pesam, sobretudo se os EUA e outros países adotarem medidas de proteção de mercado frente à escalada chinesa em IA.
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